Congresso Permanente "Literatura, Soberania Nacional e Multipolaridade"

Organizadores

Prof. Luis Eustáquio Soares (Coordenador do Núcleo Diversidade e Descolonização)

Prof. André Luís de Macedo Serrano

Profa. Andressa Santos Takao

Profa. Diana Carla de Souza Barbosa

Profa. Elizabete Gerlânia Caron Sandrini

Profa. Junia Helena Ferreira dos Santos

Prof. Marcelo Burmann dos Santos

 

O percurso

 

NÚCLEO NUDES – DIVERSIDADE E DESCOLONIZAÇÃO – OBSERVATÓRIO DE TRADUÇÕES CULTURAIS, EDUCACIONAIS, ESTÉTICAS E EPISTEMOLÓGICAS desde 2009, quando foi criado, tem desenvolvido uma série de atividades em torno do ensino, da pesquisa e da extensão, no âmbito da Universidade Federal do Espírito Santo; e muito especialmente tendo como espaço institucional de referência o Programa de Pós-Graduação em Letras da UFES – Mestrado e Doutorado.

Como exemplos, em 2017, o NUDES foi o guarda-chuva do I Colóquio Internacional Literatura e Revolução: Indústria cultural, biopolítica e imperialismo, do qual resultou o livro Literatura, biopolítica e indústria cultural do imperialismo norte-americano, organizado por André Luís de Macedo Serrano, Andressa Santos Takao, Diana Carla de Souza Barbosa e Luis Eustáquio Soares; em 2018, tornou-se a referência do II Congresso Internacional realismo estético, imperialismo e independência nacional, a partir do qual foi possível a edição do livro Realismo estético como vanguarda, organizado por Alda Maria de Jesus Corrêa, Luís Eustáquio Soares, Marcelo Burmann dos Santos, Rogério Rufino de Oliveira; em 2019, foi o núcleo de interação acadêmica que está na base do III Congresso Internacional Literatura e Revolução: o estatuto (contra)colonial da humanidade, acompanhado, ato contínuo, do livro O estatuto (contra)colonial da humanidade, organizado por Diana Carla de Souza Barbosa, Junia Zaidan e Luis Eustáquio Soares.

Em 2020 a pandemia do Covid tomou de assalto os povos do mundo e os organizadores do NUDES ficaram hibernados, revendo o percurso, concentrando-se em estudos e reconfigurando, em processo, os novos passos. O Congresso Permanente Internacional Literatura, Soberania Nacional e Multipolaridade é a proposta, em síntese dialética, ora apresentada, após a “tomada de fôlego”, no duplo sentido do termo, do interregno pandêmico.

 

Unipolaridade e multipolaridade

 

Em A ideologia alemã de Karl Marx e Friedrich Engels, é possível ler os seguintes fragmentos:

  1. “Conhecemos uma única ciência, a ciência da história” (ENGELS&MARX, 2007, p. 86)
  2. “Tão logo seja apresentado esse processo ativo de vida, a história deixa de ser uma coleção de fatos mortos, como para os empiristas abstratos, ou uma ação imaginária de sujeitos imaginários, como para os idealistas. Ali onde termina a especulação, na vida real, começa também, portanto, a ciência real, positiva, a exposição da atividade prática, do processo prático de desenvolvimento dos homens. As fraseologias sobre a consciência acabam e o saber real toma o seu lugar (ENGELS&MARX, 2007, 94-95).

 

No que diz respeito ao primeiro e segundo fragmentos citados, sob o ponto de vista dos povos, nos últimos quinhentos e tantos anos, qual tem sido a história a ser conhecida, em práxis?  Não será a que tem condenado a maioria esmagadora dos povos da humanidade a ser o efetivo objeto empirista das coleções dos fatos mortos? Que fatos são esses? Os organizadores do Congresso Permanente Internacional Literatura, Soberania Nacional e Multipolaridade partem do princípio de que os anos 1492, marco histórico da chegada de Cristóvão Colombo às Américas; e  de 1498, quando o navegador português, Vasco da Gama, circulou o continente africano pelo Cabo da Boa Esperança, constituírem dois acontecimentos fundamentais da  produção e constituição do mundo unipolar ocidental, inaugurando, igualmente, o objeto empirista tanto do sistema colonial europeu quanto do neocolonial estadunidense, a saber: a existência fática da coleção dos povos matáveis, tema do Congresso internacional intitulado O Estatuto (contra)colonial da humanidade.

 Para prosseguir com a interação dialógica com os trechos de A ideologia alemã citados, o Ocidente unipolar, essa totalidade repressiva, não poderia ser interpretado como o resultado mistificador da ação imaginária de sujeitos imaginários? E onde, nesse caso, residiria a ciência real e positiva que tenha o materialismo histórico como referência? Não sendo nem a coleção de fatos mortos, a desumanização dos povos; nem as astúcias imaginárias de um Ulisses, protagonista de Odisseia, de Homero, esse protoburguês, como o classificaram Adorno e Horkheimer em Dialética de esclarecimento, só pode ser na práxis emancipatória, multipolar e efetivamente multicultural dos povos, em relação ao chamado Ocidente coletivo, hegemonizado por EUA desde o fim da Segunda Guerra Mundial.

Se, entretanto, a “história de todas as sociedades até hoje existentes é a história das lutas de classes” (ENGELS & MARX, 2010, p. 40) e se, com Walter Benjamin de “Sobre o conceito de História”, tese oitava, “a tradição do oprimido nos ensina que o estado de exceção em que vivemos é a regra geral (BENJAMIN, 1994, p. 226), não seria possível pensar a dimensão unipolar das civilizações, para além da ocidental, como coextensiva às classes dominantes de todas as épocas, especialmente quando encarnadas misticamente na figura do oligarca?

O materialismo histórico do mundo unipolar é inseparável, assim, da tendência unipolar das classes dominantes de todas as épocas. Sua contraparte não tem sido outra senão a práxis multipolar dos povos, afirmando a si mesmos pelo encontro de civilizações, pela transversalidade multicultural, tendo fundamentalmente as relações comerciais entre povos como referência; pela mistura, o amálgama, a pluralidade, o fazer-se humano pelo encontro dos povos, na produção consciente e inconsciente da comunidade de destino do gênero humano, considerando o habitat comum: a Terra. 

 

Um reparo: o Ocidente existe?

 

Um reparo importante faz-se necessário, tendo em vista a relação entre unipolaridade oligárquica e multipolaridade-povo, a saber: o Ocidente, como salientou o filósofo argentino Enrique Dussel, no livro 1492: o encobrimento do outro (a origem do mito da modernidade), é uma invenção de si mesmo, de suas classes dominantes, pois é inseparável do Oriente, a sua origem sem origem, o seu trabalho multipolar mitologicamente ocultado na pressuposição de que, por exemplo, o berço do Ocidente seja a Grécia antiga, o que efetivamente não passa de especulação idealista, ações imaginárias de sujeitos imaginários supremacistas, razão de ser da tragédia dos povos colonizados, concebidos, de modo empirista, como coleções de corpos/fatos potencialmente  mortos.

Não sendo uma unidade discursiva essencial, o Ocidente, esse oriente, é também os seus povos multipolares, razão pela qual conheceu pelo menos trezentos anos de intensas lutas de classes, entre, sobretudo, os séculos XVIII, XIX e a primeira metade do XX. Esse é o Ocidente da Revolução Francesa, das revoltas populares de 1848, da Comuna de Paris de 1871 e mesmo da Revolução Soviética de 1917, deriva real das lutas de classes precedentes; e por isso tudo, foi o sítio histórico da emergência da práxis marxiana, nem empirista, coleção de fatos mortos, nem especulativa, idealista, com seus sujeitos e ações imaginárias, mas ciência real e positiva que tem como lei universal da história o seguinte axioma de Contribuição à crítica da economia política, de Marx: “O ser social determina a consciência humana” (MARX, 2008, p. 58).

E que ser social é esse? Pode ser o do mundo unipolar tornado ocidentalizado, ao mesmo tempo uma coleção de fatos mortos (os povos) e uma auto-invenção imaginária baseada em regras oligárquicas, sob, na atualidade, o domínio estadunidense. Pode ser a do mundo multipolar, o da humanidade de si e para si mesma. Esse é o cenário real e positivo que projeta transversalidade multipolar protagonizada por China e Rússia, pelos países do BRICS+, além e simultaneamente por projetos de integração transversais como Organização de Cooperação de Xangai (OSC), o Cinturão e Estradas (BRI), a União Econômica da Eurásia (EAEU), a Parceria da Grande Eurásia, compondo, no conjunto com a participação multilateral de grandes extensões do Sul Global, 85 por cento da humanidade

 

Por que Congresso Permanente Internacional Literatura, Soberania Nacional e Multipolaridade

 

            Os dois fragmentos citados de A ideologia alemã, ao opor coleções de fatos mortais/especulação de ações imaginárias de sujeitos imaginários, à ciência real e positiva, pressupõe um conceito de ciência, a de que o ser social determina a consciência humana, necessitando ser objetivado de modo nem empirista nem idealista. E a arte e nela a literatura como ficam? São uma ciência? Em interface com o teórico húngaro György Lukács, sobretudo considerando o seu Estética (1966), a arte não é uma ciência, que tem seus próprios métodos e formas de objetivação da realidade social; a arte e assim a literatura se constituem como uma forma de representar o fazer-se humano no humano,  partir da particularidade de cada ser, cada Maria, cada João, cada pessoa, na interface objetiva com os grandes problemas enfrentados pela humanidade.

            A arte, diversamente da ciência, constitui-se, pelos seus próprios meios de expressão, a objetivação estética da humanidade, na sua totalidade dialética intensiva, vivida pelas particularidades, pelas pessoas, com seus dramas, tragédias, desejos, limites, impotências, medos, percepções, na relação com os outros humanos, tendo a realidade concreta, esse ser social que representa a consciência, como a um tempo o pano de fundo, o mosaico, razão pela qual “toda grande arte é realista. Desde Homero”(LUKÁCS, 1969, 184).

A literatura, assim, forma-conteúdo deste congresso, há de ser também uma estética real e positiva na contramão da representação das coleções dos fatos/corpos mortos e do registro estético das ações imaginárias de homens imaginários. Essas duas formas de literatura são, em interface com Lukács, duas formas burocráticas de composição estética. A primeira tem o nome de pseudorrealismo, um modo irracionalista de “ver de perto”, ressaltando a violência naturalizada, perdendo a relação com a totalidade do ser social. A segunda, por sua vez, é antirrealista e idealista, especulação imaginária. A primeira é naturalista porque acata, nas suas tramas, a matabilidade dos povos. A segunda é antirrealista e tem como função ideológica a publicidade das classes dominantes ou a estas associadas. Ambas são a expressão estético-burocrática do Ocidente unipolar, com a seguinte diferença: o pseudorrealismo na prática e, independente do gênero, tem sido tendencialmente racista, por se limitar ao imediato-vivido dos povos não unipolares condenados à condição de matáveis, naturalizando essa condição; e o antirrealismo tem sido, em todas as suas formas, a idealização do Ocidente, com os seus supostos civilizados representantes mistificados.

            O realismo estético não é, por outro lado, uma escola literária, um estilo de época e tampouco uma representação mecanicista, empirista e mimética da realidade, pois não existe nada mais complexo que a estética real e positiva, que destitui tanto as coleções dos fatos mortos quanto as mistificações especulativas da publicidade das elites e das oligarquias, sobretudo as do presente, como as que dizem respeito ao sistema ultraimperialista estadunidense.

            E o que é o ultraimperialismo estadunidense? É a expressão planetária da milenar tradição do oprimido unipolar, com seu complexo industrial-militar-cultural-financeiro a impor ao mundo um sistema de trocas desiguais, por meio da reedição/atualização permanente das fases patriarcais, escravistas, estamentais, capitalistas, interimperialistas precedentes, manipulando-as e atualizando-as como formas de relações sociais de produção ultrapassadas em face de sua hegemônica posição estratégica, como força produtiva de vanguarda.

Constituiu-se mundialmente por meio de duas doutrinas transversais: a Doutrina Monroe, de 1823, que impôs uma estrutura de dependência para o conjunto da América Latina; e a Doutrina Truman, que estendeu a primeira para a totalidade dos países do planeta, com vistas a conformar uma arquitetura de dependência de escala mundial, absolutamente unipolar, tendo Washington como centro do sistema ultraimperialista planetário e todos os países do mundo, inclusive os europeus, como países dependentes militarmente, culturalmente, economicamente, tecnologicamente.

            A mundial estrutura de dependência do ultraimperialismo estadunidense é, do lado da matriz, triádica, tendo Europa e Japão como aliados subordinados e sobretudo os países da América Latina, da África e da Ásia como países de povos matáveis, coleção empirista de fatos/corpos mortais; condenados, se domina a unipolaridade, à dependência humilhante, miserável da metrópole mundial; Washington.

            Essa estrutura de dependência mundial do mundo unipolar comandado por EUA objetivamente configurou a sua antítese, na práxis dialética dos povos, da seguinte forma: soberania nacional, concebida como sujeito real e positivo da constituição de uma humanidade multipolar. O Congresso Permanente Internacional Literatura, Soberania Nacional e Multipolaridade, propõe, pois, pensar, discutir, colaborar para a produção de um conceito de literatura que corresponda a esta verdade vital, em interface com Nelson Werneck Sodré, de História e materialismo histórico no Brasil: “Só é novo, na realidade, o que se vincula ao nacional e ao popular (SODRÉ, 1985, p. 97).

 

Objetivos 

            Se, com Engels, o realismo estético define-se como  “a representação exata dos caracteres típicos em circunstâncias típicas” (ENGELS, 1974, p. 195), os  seguintes formulados em forma de questões são fundamentais para o Congresso Permanente Internacional Literatura, Soberania Nacional e Multipolaridade:

 

  1. Quais são as personagens típicas das circunstâncias históricas típicas do mundo unipolar estadunidense, seja do lado da metrópole, seja do lado do eixo dependente?
  2. Quais são as personagens típicas das circunstâncias históricas típicas do mundo multipolar contemporâneo?
  3. Como os diferentes gêneros literários devem plasmar as personagens típicas do mundo unipolar estadunidense, em sua versão de corpos matáveis, representados de modo pseudorrealistas; e em sua dimensão idealista e antirrealista?
  4. Como os diferentes gêneros literários devem plasmar as personagens típicas do mundo multipolar emergente?

 

Formato do Congresso

 

Serão realizadas uma conferência por mês de forma virtual, em Outubro.

Em 2024, haverá momento presencial no Congresso, na UFES, com um dia para a realização de comunicações apresentadas pelos inscritos.

 

Das inscrições (gratuitas)

 

Serão três formas de inscrição::

 

  1. Inscrições como ouvintes – com certificado fornecido pelo Núcleo Diversidade e Descolonização, vinculado ao Programa de Pós-Graduação em Letras – Mestrado e Doutorado. Data das inscrições: A partir de 10 de outubro de 2023 a 10 de dezembro de 2023. No Formulário: https://forms.gle/LkNbLNrsdyyisguX8
  2. Inscrições para comunicação - com certificado fornecido pelo Núcleo Diversidade e Descolonização, vinculado ao Programa de Pós-Graduação em Letras – Mestrado e Doutorado.  Data das inscrições: 10 de outubro de 2023 a 10 de dezembro de 2023. No formulário:  https://forms.gle/EP87BWadk9QRvPJF6
  3. Inscrição para conferencista – Serão oferecidas três vagas para conferencistas. A escolha será realizada por sorteio. Data das inscrições: 10 de outubro de 2023 a 10 de dezembro de 2023. No formulário: https://forms.gle/i8NXb8MLjhtZ9XiJ7

Obs. É possível inscrever-se ao mesmo tempo como ouvinte e como proponente a apresentar comunicações.

  1. Inscrição para monitoria - com certificado fornecido pelo Núcleo Diversidade e Descolonização, vinculado ao Programa de Pós-Graduação em Letras – Mestrado e Doutorado; para as funções de: 1) manutenção de site do evento e divulgação, 2) coordenador das salas de comunicação.  Data das inscrições: 10 de outubro de 2023 a 10 de dezembro de 2023. No formulário: https://forms.gle/HcGToibxMf3syohSA

Observação primeira: para receber o certificado de ouvinte é preciso estar presente em oitenta por cento das conferências

Observação segunda: as comunicações serão presenciais e ocorrerão na UFES em data ainda a ser apresentada.

Dúvidas: congressoliteraturasoberaniaem [at] gmail.com

 

Referências

BENJAMIN, Walter. “Sobre o conceito de história”. In:. Magia, técnica, arte e política: ensaios sobre literatura, história e cultura. Trad. Carlos Felipe Moisés e Ana Maria Ioriatti. São Paulo: Companhia das Letras, 1996, 226.

ENGELS, Friedrich & MARX, Karl. A ideologia alemã. Trad. Rubens Enderle, Nélio Schneider, Luciano Cavini Martorano. São Paulo: 2007.

MARINI, R. M. Dialética da dependência. In: SADER, E. (Org.). Dialética da dependência: uma antologia da obra de Ruy Mauro Marini. Petrópolis: Vozes/CLACSO/Laboratório de Políticas Públicas, 2000. pp. 105-165. (Coleção A Outra Margem

SODRÉ, Nelson Werneck. Fundamentos do materialismo histórico. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1968.

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